Muitas vezes ouvimos dizer que
vocação é chamado. Mas o que realmente significa ser chamado?
Em primeiro lugar cabe
lembrar-nos de que quando chamamos alguém, naturalmente afirmamos sua
existência, sua identidade expressa por seu nome. Deus chamou Samuel pelo nome (1
Sm 3,1-10), colocou-se lado a lado com Gedeão (Jz 6,11), dirigiu-se a Jeremias falando-lhe
se sua eterna eleição (Jr 1,4-8), manifestou-se a Isaías, que ouviu Sua voz
clamando por um mensageiro (Is 6,1-8).
Chamar implica em voz, palavra, o
ato de falar. A compreensão bíblica do ato de falar relaciona-se com o sopro
vital. Quando falamos precisamos da respiração. O homem da Bíblia não
compreendia a fisiologia do corpo, mas constatava que ausência de respiração era
sinal de morte. Logo o ato de falar estava ligado a vida, a própria existência.
Assim, Deus dá vida ao homem ao soprar-lhe as narinas (Gn 2,7). Palavra para o
povo da Bíblia era dabar. O termo dabar se trata ao mesmo tempo do ato de
falar, do sentido da palavra e da coisa em si. Mackenzie[1]
afirma que “a palavra libera uma energia psíquica, e quando pronunciado com
poder, gera a realidade que significa”. Neste sentido, podemos imaginar que
quando Deus pronuncia um chamado, sua própria vida é “expirada”, ou seja, o ato
de Deus chamar traz ao chamado algo da essência de Deus.
Marcos, primeiro Evangelho
escrito, já no primeiro capítulo (Mc 1,16-20) enfatiza o chamado de Jesus aos
seus discípulos. Ele olha e escolhe entre os pescadores, que podemos imaginar
que seriam muitos, e chama ao seguimento. Aqueles rudes homens sentem a força
daquele chamado e colocam-se no seguimento do Mestre. Cabe lembrar que no tempo
de Jesus, eram os interessados quem procuravam o mestre. Jesus é um Mestre
diferente. Na verdade, Ele não é um mestre. Ele é uma pessoa que nos chama a um
relacionamento pessoal, a um encontro.
Um encontro é sempre uma novidade
a ser contada. Quando, no mercado, no shopping, na praia, vemos alguém que a
tempos não víamos, quando chegamos em casa, já nos adiantamos a contar quem
vimos e o que ouvimos. Se fulano estava gordo ou magro, se fulano casou-se ou
está de emprego novo. Ou se experimentamos uma boa comida em um restaurante, já
nos adiantamos em divulgar a delícia e procuramos voltar para mais uma vez nos
deliciarmos.
Desta forma, vocação é, antes de
mais nada, Deus que conhece cada pessoa e se dirige a nós fazendo-nos
participar de sua vida, quando somos chamados à existência e, de forma ainda
mais intensa, quando nos escolhe para o seguimento de Seu Filho. O seguimento
parte de um encontro fundante que gera decisões de vida, eleição de valores,
conversão. Tal encontro gera a alegria de haver encontrado Aquele que pode
trazer o verdadeiro sentido da vida. Essa é a grande novidade que o discípulo
sente-se movido a anunciar.
Quando nos encontramos com uma pessoa de confiança
falamos-lhe de nossa vida, de nossas necessidades, de nossas preocupações,
pedimos sua sugestão acerca de decisões que devemos tomar. Assim deve ser
também o encontro com Cristo. Por isso, antes de falar em vocações específicas
cabe falar de encontro. A vocação específica é consequência do diálogo que
acontece no encontro com o Senhor que indica o caminho da realização plena a
cada pessoa. E essa descoberta é a novidade por excelência a ser espalhada. Assim,
o encontro com Jesus Cristo vivo nos faz seus discípulos missionários.
Ir. Valéria Andrade Leal
[1] PALAVRA. In.: MCKENZIE, John L.. Dicionário Bíblico. São Paulo: Paulinas, 1983, p. 682.
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